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freud, ainda...


entre as coisas que passam e as que não passam,

o entre das coisas. ganhar um nome,

esquecer e nunca mais lembrar. nomear coisas,

um começo.

foto_claudia itaborahy

foto| claudia itaborahy

começamos, assim,

com a primavera, um inverno fora de época,

tudo quase seco, alucinados pelo desejo da chuva.

começamos assim -

uma coleção de textos que contam, um pouco, das noites no ateliê.

começamos assim:



____ a constituição do sujeito passa por uma organização inicial, infantil. antes mesmo do édipo e da castração, um caminho é colocado pelo sujeito: um circuito da pulsão, uma poética pulsional. antes do verbo, havia corpo. e antes do corpo, o que é que sempre (h)ouve? engraçado ler “organizações da libido” se o que leio e escuto é uma completa desorganização – expulsão, repulsão, impulsão. palavra inventada para traduzir trieb – que, em alemão, parece palavra cotidiana, ouvi dizer. palavra que remete, significando arremessar, jogar, colocar algo em relação com outro algo. trieb, pulsão. pode ser instinto, mas não é só instinto. quando leio a organização genital infantil, minha cabeça abre buracos. talvez isso seja a vontade de saber – os buracos que se abrem na minha cabeça. não há organização genital, nem infantil, nem na vida dos adultos. há uma tentativa de pesquisar e entender como é que se formam corpos, pessoas, homens, mulheres, plantas e bichos. penso a organização infantil como uma pesquisa da criança em busca daquilo que ela não sabe. teorias particulares, singulares, construções – material restante e reprimido, recalcado, no inconsciente. por isso, penso eu, Freud vai dizer de uma certa similaridade entre vida sexual infantil e vida sexual dos adultos. quando é que essa pesquisa termina? será que ela termina? parece sempre, que estamos a olhar os corpos, a natureza – os bichos e as plantas. os corpos ensinam. e como selos que possibilitam o endereçamento de uma carta, o corpo poderia ser um envelope, como escreveu Drummond – um corpo, envelope selado, que me sabe mais do que eu sei. o corpo é composto de selos, é composto de pesquisas e segredos. o corpo é id, antes de ego, superego. ele é qualquer coisa que traz o meu selo (sê-lo) – ser algo, alguma coisa, uma pessoa – das ding, a coisa. um ponto, uma ontologia do ser. e o que haveria, nessa constituição, capaz de selar, capaz de ligar, de me fazer endereçar-me a mim, à vida e aos outros? no meio dessas perguntas, inquieta-me a primazia do falo, não por excessos feministas, mas pela dificuldade de ver o não-todo, o não-toda, no vai e vem de corpos, histórias e sofrimentos psíquicos. quando freud escreve “___em tudo isso o genital feminino não parece jamais ser descoberto”, leio femininamente – e com generosidade – uma promessa, um flerte, uma espera de que o feminino precisaria ser descoberto, revelado coberto e descoberto, velado e desvelado, feito uma operação incessante de entender o feminino, inclusive com lacan, de que ser mulher é diferente de ter ou não ter um pênis. é com lucia castello branco e maria gabriela llansol, e mais uma legião de legentes, que ouso inscrever na nossa pesquisa, a possibilidade de ler gentes para além do pênis, em uma abertura e construção, daquilo que Llansol chama feminino de ninguém. a constituição do sujeito, em freud, é composta e atravessada por essa sua pesquisa e enigma sobre o feminino, a feminilidade. pelas vias da clínica, pela escuta de homens e, principalmente, de mulheres, que Freud, talvez vestido com a armadura da deusa Atena – a cabeça da medusa, guardiã e protetora – é que ele consegue caminhar, parar, caminhar, voltar e caminhar mais um pouco, claudicante, nessa sua pesquisa em psicanálise, que, como ele diz, apresenta-se de forma difícil, porque recusa e evita os traços gerais e as relações características. mas, como cientista, teórico, ele lançou mão de medusa, de outros mitos, dessas similaridades nos casos para dar conta de compor uma teoria que pudesse sobreviver por tempos... até quando, não sei. ontem, 23 de setembro, em Londres, morria freud, há 80 anos atrás.



ateliê de psicanálise e outras artes

24 de setembro de 2019, ouro preto

claudia itaborahy

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